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    Os nomes bizarros de Star Wars no Brasil: traduções amaldiçoadas que viraram piada

    Quando Star Wars chegou ao Brasil, muito além da aventura galáctica e dos sabres de luz, o público foi surpreendido por nomes que pareciam ter vindo de uma galáxia realmente muito distante — e confusa. Entre adaptações estranhas e erros de tradução, personagens icônicos como Darth Vader e Chewbacca ganharam versões nacionais que beiravam o cômico. Neste artigo, vamos explorar os “cursed names” (ou nomes amaldiçoados) da franquia no Brasil, revelando como essas escolhas se tornaram motivo de piada entre os fãs e marcaram a cultura pop nacional.

    🌌 Planetas

    Em uma galáxia tão vasta como a de Star Wars, os planetas não são apenas cenários; são personagens por si só, cheios de história, cultura e mistérios. Alguns desses mundos têm nomes que, aos ouvidos brasileiros, soam no mínimo curiosos. Seja uma terra desértica marcada por batalhas épicas ou um planeta montanhoso adornado por auroras celestes, cada um desses lugares carrega seu peso na saga — e, às vezes, um nome que arranca um sorriso do fã mais atento.


    Utapau

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    Utapau é um planeta do universo de Star Wars, localizado na Orla Exterior (Outer Rim Territories). Ele é mais conhecido por suas enormes crateras naturais, chamadas de sinkholes, onde se desenvolveram as cidades subterrâneas do planeta. Essas cavernas gigantescas servem como proteção natural para as espécies locais: os Pau’ans, altos e esguios, e os Utai, pequenos e robustos.
    Utapau tem grande importância em Star Wars: Episode III – Revenge of the Sith, pois é lá que Obi-Wan Kenobi confronta e derrota o General Grievous, encerrando a liderança militar do vilão na Confederação Separatista. Visualmente marcante por seus cânions profundos e arquitetura integrada ao terreno, Utapau simboliza a transição para os momentos finais das Guerras Clônicas e o início do domínio do Império.


    Arrochar

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    Arrochar é um planeta montanhoso e remoto que aparece no cânone expandido, especialmente nos quadrinhos da série Star Wars (2013), conhecida pelo arco “Rebel Girl”. O planeta abriga uma sociedade monárquica que oferece um refúgio seguro para a Aliança Rebelde. Como parte de uma estratégia para solidificar essa aliança, a Princesa Leia concorda em um casamento arranjado com o príncipe local, propondo unir os interesses políticos dos dois mundos.
    Porém, a aparente hospitalidade de Arrochar esconde um pacto com o Império. O planeta torna-se palco de uma traição devastadora, quando tropas imperiais são secretamente chamadas para emboscar os rebeldes. Arrochar simboliza a constante luta da Aliança em equilibrar diplomacia e sobrevivência em meio à guerra galáctica.


    Jakku

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    Planeta desértico apresentado em Star Wars: The Force Awakens (2015). Foi palco da Batalha de Jakku, devastadora disputa naval entre a Nova República e o Império, anos após Return of the Jedi. Hoje é lar de sucateiros que garimpam destroços das grandes naves que ainda lotam o deserto. É onde Rey é encontrada como sobrevivente solitária entre relíquias do passado imperial.


    Kordoku

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    Kordoku era um planeta montanhoso e gelado que abrigava um antigo Templo Jedi. Conhecido por sua atmosfera, que produzia auroras de luzes verdes e rosadas, o planeta tinha um aspecto azul e branco quando visto do espaço. Kordoku se destaca por sua ligação espiritual com a Ordem Jedi e sua paisagem deslumbrante no universo expandido.


    🚀 Objetos / Veículos

    Star Wars está repleto de criaturas exóticas e itens que enriquecem o universo da franquia. Montarias de mundos distantes, frutas típicas de oásis esquecidos ou artefatos usados no dia a dia galáctico ajudam a compor um universo vibrante e vivo. Mas, vez ou outra, o nome escolhido para essas criações parece ter vindo com um toque involuntário de humor quando ouvido por fãs brasileiros — e é impossível não notar.


    A Fruta Pika

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    Pika era uma fruta doce, cultivada em oásis de Tatooine, especialmente apreciada pelo Povo da Areia. Além de ser consumida fresca, a Pika podia ser usada para preparar bebidas alcoólicas e bolos tradicionais. O jovem Anakin Skywalker, em The Phantom Menace, compra Pikas da vendedora Jira. Embora não faça parte do cânone atual, o nome e a descrição da fruta foram registrados em fontes do antigo Legends e materiais suplementares.


    Cu-pa

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    Os cu-pa eram criaturas bípedes nativas de mundos da Orla Exterior, incluindo Nam Chorios e Tatooine. Considerados parentes distantes dos tauntauns, os cu-pa serviam como montaria em regiões áridas e montanhosas, onde suas patas largas e corpo robusto lhes conferiam boa adaptação ao terreno hostil. Eles aparecem em materiais do universo expandido.


    Cruzador classe Gozanti

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    O cruzador classe Gozanti é uma nave leve e versátil do Império Galáctico, muito utilizada como transporte de tropas, veículos e caças TIE. Com um design robusto e funcional, o Gozanti possui um hangar capaz de carregar pequenas naves ou até veículos terrestres, e pode ser configurado com diferentes tipos de armamento, como torres de laser.
    O cruzador é destaque em diversas produções do universo expandido e da nova era Disney, como nas séries Star Wars Rebels e The Mandalorian, onde é visto frequentemente escoltando cargueiros maiores ou patrulhando sistemas ocupados pelo Império. A nave exemplifica a padronização imperial: simples, eficaz e opressora, sempre pronta para subjugar planetas e rebeldes.


    🧑‍🚀 Personagens

    De Jedi nobres a contrabandistas ousados, passando por mercenários e civis comuns, o universo de Star Wars está repleto de figuras memoráveis. Entre eles, há personagens cujos nomes, embora sérios em sua origem, despertam a curiosidade — ou o riso — por conta de suas sonoridades peculiares no português. Eles são parte integral da galáxia muito, muito distante e também das listas de nomes mais comentados entre os fãs do Brasil.


    Ajunta Pall

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    Ajunta Pall é um dos personagens mais importantes das origens dos Sith. Ele foi um dos Jedi que, durante a Hundred-Year Darkness, caiu para o Lado Sombrio após experimentar com alquimia e criar monstros e armas proibidas. Após ser banido pela Ordem Jedi, Ajunta liderou um grupo de exilados que se estabeleceu no planeta Korriban, onde se tornou o primeiro Lorde dos Sith.
    Em Knights of the Old Republic, o jogador encontra o espírito de Ajunta Pall em seu túmulo em Korriban. O antigo Sith, arrependido por seus crimes e por ter criado um legado de violência, desafia o jogador a identificar sua verdadeira lâmina como um teste de sabedoria e moralidade. Ajunta representa o trágico início da linhagem Sith e os perigos da sede por poder.


    Boc Aseca

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    Boc Aseca era um Twi’lek das forças do Lado Sombrio, membro dos Sete Jedi Sombrio sob o comando do Inquisidor Jerec em Jedi Knight: Dark Forces II (Legends). Boc havia tentado se tornar Jedi, mas, rejeitado por sua idade, entregou-se ao Lado Sombrio. Conhecido por sua risada insana e seu estilo de luta com dois sabres de luz (Jar’Kai), ele era um adversário perigoso e imprevisível.


    Bogga

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    Bogga, conhecido como O Grande Bogga, foi um poderoso senhor do crime da espécie Hutt que atuou durante o período que antecedeu a Grande Guerra Sith. Bogga controlava territórios no setor Hutt e liderava redes de contrabando e tráfico em grande escala, consolidando sua posição na hierarquia do submundo galáctico. Sua figura imponente e influência marcaram a ascensão do poder dos Hutt em uma época de crescente instabilidade na galáxia.


    Boga

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    Boga era uma majestosa criatura da espécie Varactyl, nativa das vastas crateras de Utapau, especificamente da região de Pau City. Com suas penas coloridas e agilidade surpreendente, ela serviu como montaria para Obi-Wan Kenobi durante a perseguição ao General Grievous em Revenge of the Sith. A relação de confiança entre Obi-Wan e Boga no calor da batalha se tornou uma das cenas mais marcantes do filme, mostrando a conexão do Jedi com os seres vivos da galáxia.


    Bolla Ropal

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    Mestre Jedi rodiano que lutou durante as Guerras Clônicas. Bolla Ropal guardava um holocrão contendo informações sensíveis sobre crianças sensíveis à Força espalhadas pela galáxia. Foi capturado por Cad Bane e torturado até a morte no planeta Devaron para que entregasse o cristal kyber que protegia. Sua história aparece na série The Clone Wars (2ª temporada).


    Conde Dooku

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    Conde Dooku, também conhecido como Darth Tyranus, é um dos principais vilões da trilogia prequel. Ex-membro da Ordem Jedi e discípulo de Yoda, Dooku abandona os Jedi por acreditar que a República estava corrompida. Ele se torna aprendiz de Darth Sidious e líder da Confederação dos Sistemas Independentes.
    Dooku é responsável por orquestrar as Guerras Clônicas, manipulando tanto os Separatistas quanto a República para alimentar o plano dos Sith de instaurar o Império. Um espadachim habilidoso e político carismático, Dooku representa a falência da diplomacia e o perigo das ambições pessoais.


    Capitão Panaka

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    Quarsh Panaka é o chefe de segurança da Rainha Amidala no planeta Naboo, apresentado em The Phantom Menace. Leal, metódico e extremamente cauteloso, Panaka lidera a guarda real durante a crise causada pela invasão da Federação do Comércio. Sua vigilância ajuda Amidala e seus aliados a escaparem da ocupação e organizarem a resistência.
    No cânone expandido, Panaka acaba se tornando um Moff do Império, um destino irônico para alguém que tanto prezava pela proteção de seu povo, mas que sucumbiu à influência do novo regime autoritário.


    Fodo & Ashana

    Fodo e Ashana fazem parte da banda fictícia Twisted Rancor Trio, cujos registros aparecem no jogo Star Wars: Knights of the Old Republic. Fodo é um músico da espécie Bith, enquanto Ashana é uma cantora humana de Taris. Eles são citados em datapads encontrados pelo jogador durante uma missão de quebra-cabeça na cidade baixa de Taris, onde o jogador precisa organizar os dados para abrir uma porta de segurança.
    Embora não apareçam diretamente no enredo, Fodo e Ashana compõem o colorido pano de fundo cultural de Taris, refletindo a vibrante (e decadente) cena artística da cidade antes de sua destruição pelo Império Sith.


    Mestre Sifo-Dyas

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    Sifo-Dyas era um mestre do Conselho Jedi, conhecido por suas visões perturbadoras que previam um grande conflito galáctico. Movido por essas premonições e preocupado com a segurança da República, ele secretamente encomendou a criação de um exército de clones em Kamino — uma decisão que se tornaria o ponto de partida para as Guerras Clônicas.
    Embora suas intenções fossem nobres, Sifo-Dyas acabou sendo manipulado por Darth Sidious e o conde Dooku. Após sua morte (planejada por seus inimigos), seu nome foi usado como fachada para os planos sombrios dos Sith. O mistério em torno de Sifo-Dyas alimenta parte da trama de Attack of the Clones e das investigações de Obi-Wan Kenobi.


    Na’dar Vebb

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    Na’dar Vebb é um Jedi Mon Calamari que aparece na série animada The Clone Wars. Ex-padawan do mestre Kit Fisto, Na’dar participa da missão que visa capturar o General Grievous em sua fortaleza. Impulsivo e ansioso por provar seu valor, Na’dar acaba desobedecendo ordens cautelosas e enfrenta Grievous em um duelo, no qual é mortalmente derrotado.
    Sua história funciona como uma lição sobre os perigos do orgulho e da imprudência no caminho Jedi, reforçando os temas de honra e sacrifício presentes na Ordem.


    Fodesinbeed Annodue

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    Figura alienígena do universo Star Wars Legends, lembrado mais por seu nome incomum do que por feitos. Aparentemente aparece em ambientes de cantina ou como figurante, sem papel narrativo relevante. Tornou-se conhecido no Brasil por seu nome soar peculiar aos falantes de português.


    Pikka Adren

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    Pikka Adren é uma empreiteira que viveu na Era da Alta República. Ela e o marido participaram da construção da estação espacial Farol da Luz Estelar, um dos maiores símbolos do poder e da esperança da República na época. Sua função era coordenar equipes de construção e garantir a integridade das estruturas.


    Toba

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    Toba era um Gungan contrabandista e aventureiro que viveu durante a Grande Paz da República. Jovem e ousado, ele se envolveu em várias excursões perigosas e aproveitou a vida como um playboy até a Invasão de Naboo. Após o ataque ao seu planeta natal, Toba se alistou no Exército Gungan para defender sua terra natal.


    As Irmãs Dengue

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    As Irmãs Dengue eram alienígenas da espécie Culisetto, vistas no palácio de Maz Kanata em The Force Awakens. Reconhecidas por suas vestimentas tradicionais da espécie e seu amor por jogos como o Sonho da Deia, as irmãs foram identificadas no Dicionário Visual de O Despertar da Força por Pablo Hidalgo. Embora passem despercebidas na ação do filme, elas têm um lugar peculiar nos registros do universo expandido.


    Fodo Medoo

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    Rodiano apostador que viveu durante a Guerra Civil Jedi, entre a República Galáctica e o Império Sith. Fodo Medoo realizava serviços de transporte para a Corporação Czerka em Kashyyyk e passava o tempo livre jogando pazaak, um popular jogo de cartas.


    Chata Hyoki

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    Selkath mercenário que atuou durante as Guerras Clônicas. Foi contratado pelo Conde Dooku (Dookan) para intimidar senadores e tentar assassinar Padmé Amidala. O plano falhou, e Chata foi preso pelas forças da República.


    Travecao Govan

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    Jedi que lutou durante a Velha República. Travecao fez parte da força liderada por Satele Shan que se estabeleceu em Yavin 4, formando a Coalição de Yavin em oposição ao movimento Revanita e ao Sith Darth Marr.


    Viado Denan

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    Houk que serviu ao Império Sith reconstituído na época da Velha República. Viado Denan participou de operações militares como parte das forças do Império durante os conflitos com a República Galáctica.

  • OSCAR 2025| Quais categorias Anora merece ganhar?

    OSCAR 2025| Quais categorias Anora merece ganhar?

    Dirigido por Sean Baker, Anora apresenta 6 indicações ao Oscar 2025, mas quais destas ele realmente apresenta chances?

    A história da Gata Borralheira, Cinderela para os íntimos, é uma das histórias seculares da humanidade. Apresentando diversas versões ao longo dos anos, suas versões literárias mais conhecidas são as de Charles Perrault, 1697, e dos Irmãos Grimm, 1812.

    Apresentando sua primeira versão cinematográfica em 1899 pelas mãos de George Méliès, a história de uma garota bondosa e humilde que é transformada por meio do amor, já foi adaptada de maneira fiel, como na animação clássica da Disney, Cinderella (1950, Clyde Geronimi, Hamilton Luske e Wilfred Jackson), de maneiras contemporâneas como em Uma Linda Mulher (1990, Garry Marshall) e por fim, de maneiras subversivas, como é o caso de Anora (2024, Sean Baker).

    Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes 2024, Anora conta a história de uma stripper que se casa com um jovem oligarca russo, permitindo uma drástica mudança de vida na medida que se torna uma esposa troféu, porém, esta felicidade é ameaçada pelos pais do rapaz.

    Apesar de aparentar simples, Anora ganha força por conta de sua hábil junção de gêneros. Inicialmente um romance clichê, no segundo ato assistimos uma das melhores comédias anos 90 do ano de 2024, e terminamos assistindo um drama que destrói a nossa alma. Um exemplo da complexidade de compreensão deste filme, se encontra um senhor que estava presente na sessão a qual assisti o filme. Na marca de 50 minutos, quando se inicia os momentos cômicos da produção, ele gritou bem alto que o filme estava terrível e de repente ficou muito bom. Ao final do filme, ele aplaudiu.

    Indicado à 6 categorias na competição do Oscar 2025, o seguinte artigo pretende examinar as categorias que Anora apresenta mais chances de ganhar.

    MELHOR FILME

    Anora

    Pôster Oficial de Anora

    Indicados:

    • Brian Young e Brady Corbet por O Brutalista
    • Coralie Fargeat por A Substância
    • Dennis Villeneuve, Mary Parent, Cale Boyter e Patrick McCormick por Duna: Parte 2
    • Edward Berger, Robert Harris e Juliette Howell por Conclave
    • James Mangold e Timothée Chalamamet por Um Completo Desconhecido
    • Jon M. Chu por Wicked
    • Joslyn Barnes, Dede Gardner e Jeremy Kleiner por Nickle Boys
    • Pascal Caucheteux e Jacques Audiard por Emilia Perez
    • Sean Baker, Alex Coco e Samantha Quan por Anora
    • Walter Salles e Rodrigo Teixeira por Ainda Estou Aqui

    Anora é um filme que não agrada à todos. Na medida que vivemos em uma sociedade conservadora, na qual até mesmo a geração Z se sente desconfortável com cenas de sexo em filmes. Anora não apresenta medos de mostrar cenas de sexo e os seus prazeres, algo essencial em um filme cuja protagonista é uma stripper super satisfeita com a sua linha de trabalho, que se casa com um moleque de 21 anos que somente pensa em transar e jogar videogame.

    Em seguida, Anora entra em o seu arco de comédia, no melhor estilo Os Trapalhões e com um excelente uso de comédia física. Os momentos nos fazem rir alto, para em seguida refletirmos e nos sentirmos desconfortáveis por termos rido, novamente, deixando o público desconfortável.

    A cereja do bolo, é o seu final arrebatador. Destruindo a ilusão daqueles que acreditavam em um final feliz para Ani, semelhante aos contos de fadas e às fantasias hollywoodianas, a produção termina com sua protagonista percebendo que foi usada, que ela não é nada e jamais foi durante toda a história retratada. E o que ela faz com esta decisão? Inicia uma transa com o único homem realmente bom do filme inteiro, porém, no meio do ato ela quebra, e percebe que necessita de uma acolhida e um abraço terno, e não um êxtase carnal. Novamente deixando o público desconfortável.

    Greta Gerwig, diretora, roteirista, ativista pelos direitos da mulher e feminista, ter sido a presidente do júri na edição de 2024 do festival de Cannes, edição em que Anora recebeu o maior prêmio do festival em cima de outras produções como A Substância (2024, Coralie Fargeat) e Emilia Perez (2024, Jacques Audiard), permite uma compreensão muito clara de porque Anora ganhou tanto sucesso e reconhecimento: o filme é humano e crível, subvertendo um gênero milenar de Hollywood: a comédia romântica, em pró de uma reflexão sobre sonhos e desejos em uma sociedade cruel.

    Acredito que Anora apresente chances no Oscar por conta disso, seu retrato verossímil sobre a nossa sociedade hipócrita. A academia gosta de produções que nos instigam a refletir sobre questões mundanas, Moonlight (2016, Barry Jenkins), Green Book (2018, Peter Farrely) e Nomadland (2020, Chloé Zhao) são exemplos disso.

    MELHOR DIRETOR

    anora

    Indicados:

    • Brady Corbet por O Brutalista
    • Coralie Fargeat por A Substância
    • James Mangold Um Completo Desconhecido
    • Jacques Audiard por Emilia Perez
    • Sean Baker por Anora

    Se analisarmos a cinematografia de Sean Baker, podemos conferir o seu apreço por histórias do submundo daqueles apelidados de “trabalhadores do sexo”, Red Rocket (2021) e Tangerine (2015) são alguns exemplos. Lidando com esta temática de modo muito humano, Baker se destaca neste retrato anti hollywoodiano. Ao invés de enaltecer e mostrar como as coisas deveriam, ou poderiam ser, ele opta por mostrar como elas realmente são, algo a se considerar na competição pelo Oscar de 2025, cujo maior concorrente se encontra em Brady Corbet por O Brutalista (2025).

    Jacques Audiard apresenta poucas chances de vitória, especialmente após pronunciamentos polêmicos que conseguiram ofender de mexicanos à franceses, assim, sobram Coralie Fargeat, a única mulher na competição, e James Mangold, um diretor que ou acerta muito ou erra feio.

    Coralie Fargeat demonstrou em A Substância (2024), um excelente domínio técnico, principalmente em sua fotografia e direção, porém, sabemos que o Oscar não aprecia filmes de horror.

    James Mangold é um diretor conhecido por sua cuidadosa cinematografia e surpresas como Logan (2017), na mesma medida que desastres tenebrosos como Indiana Jones e a Relíquia do Destino (2023), seu forte são cinebiopias e retratos de histórias verídicas, porém, Um Completo Desconhecido (2025) aparenta seguir uma direção segura demais para uma competição que inclui a ousadia de Baker e Fargeat.

    MELHOR ROTEIRO ORIGINAL

    anora 2

    Mikey Madison em cena de Anora– Divulgação Universal Pictures

    Indicados:

    • Brian Young e Brady Corbet por O Brutalista
    • Coralie Fargeat por A Substância
    • Jesse Eisenberg por A Verdadeira Dor
    • Moritz Binder, Tim Fehlbaum e Alex David por Setembro 5
    • Sean Baker por Anora

    Como discutido anteriormente, uma das maiores forças de Anora se encontra em seu roteiro subversivo que mescla três gêneros, romance, comédia e drama, dentro de um filme que nos faz refletir sobre a hipocrisia humana, na mesma medida que nos deixa desconfortáveis seja por meio de cenas de sexo, ou pensamentos intrusivos, algo que não satisfaz o público, principalmente nos dias de hoje, e talvez por isso que irá ganhar, mesmo apresentando um roteiro tão divisivo.

    DEMAIS CATEGORIAS

    Dentro de suas 6 categorias indicadas, Anora também concorre em melhor edição, melhor atriz principal para Mikey Madison e melhor ator coadjuvante para Yuri Borasov.

    Ambos os atores, apesar de capazes, são jovens e apresentarão outras oportunidades maiores no futuro para competir pelo prêmio. Mikey Madison estava matando pessoas em Pânico (2022, Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillet), não faz nem 5 anos, apesar do Oscar ser algo a se considerar, em um ano com atuações maestras como a de Demi Moore e Fernanda Torres, acredito que ela apresente poucas chances.

    Yura Borasov, apesar de estar com 33 anos e mais de 50 créditos no IMDB, apresenta força por meio de pequenos comentários e olhares, algo que poderia garantir sua vitória se não estivesse concorrendo com nomes como Edward Norton e Kieran Culkin, os favoritos para o prêmio.

    Em questão da edição do filme, o maior impedimento para a sua vitória se encontra em Conclave (2025, Edward Berger), afinal, o thriller sobre a escolha do papa consegue prender bem mais do que “o filme da stripper que estava terrível e ficou muito bom”, como disse oportunamente o meu companheiro de sala.

    CONCLUSÃO

    Anora é um filme que provavelmente iniciará uma onda de reflexões e pensamentos com os anos, tendo se tornado um clássico com um tempo muito pequeno de vida, grande parte por conta de suas atuações de destaque, um roteiro que mescla o melhor do drama com o melhor da comédia, um retrato honesto da humanidade e da vivência de uma classe trabalhadora que optamos muitas vezes desviar o olhar para: os “trabalhadores do sexo”.

    Apesar de isto não ser suficiente para levar todos os 6 prêmios que concorrerá na noite do dia 02 de Março de 2025, só nos resta esperar e torcer pelos caminhos que esta noite tomará.

    Leia também:

  • OSCAR 2025| Quais categorias Conclave merece ganhar?

    OSCAR 2025| Quais categorias Conclave merece ganhar?

    Dirigido por Edward Berger, Conclave apresenta 8 indicações ao Oscar 2025, mas quais destas ele realmente apresenta chances?

    Em 1929, ocorreu a primeira cerimônia dos prêmios da academia em uma pequena celebração no Roosevelt Hotel, a cerimônia durou 15 minutos e foram distribuídos 15 prêmios para vencedores que foram anunciados três meses antes.

    95 anos depois e após muitas mudanças, a cerimônia agora nomeada “The Oscars”, continua sendo considerado o maior prêmio da indústria cinematográfica, mesmo tendo perdido muita credibilidade, por motivos que não cabem neste artigo.

    Conclave é um dos favoritos da competição deste ano. Um thriller que discute sobre a cerimônia de nomeação de um novo papa, no melhor estilo Game of Thrones, ele é extremamente bem executado em quesito de roteiro, atuação, arte, montagem, entre outras. Categorias que a Academia considerou em suas indicações.

    Apesar de seus concorrentes serem filmes tão bons quanto, Conclave apresenta algumas vantagens que o favorecerão a vencer certos prêmios. O seguinte artigo pretende examinar as categorias que a produção apresenta mais chances de ganhar.

    MELHOR ATOR

    Conclave

    Ralph Fiennes como Cardeal Lawrence em Conclave- Foto de Divulgação

    Indicados:

    • Adrien Brody por O Brutalista
    • Colman Domingo por Sing Sing
    • Ralph Fiennes por Conclave
    • Timothée Chalamet por Um Completo Desconhecido
    • Sebastian Stan por O Aprendiz

    Concorrendo pela terceira vez, Ralph Fiennes apresenta a melhor perfomance de sua carreira como Cardeal Lawrence, elevando a obra a altos níveis de uma maneira que o personagem jamais precisa se exaltar para mostrar sua verdadeira força, segundo Eduardo Lavinas em sua crítica do filme: “Sua performance é o eixo moral do longa, enfrentando dilemas internos e externos enquanto busca o “homem ideal” para o mais alto cargo da Igreja.”

    Sebastian Stan está em sua primeira indicação e com tudo o que está acontecendo nos EUA, acredito que sua performance como Donald Trump ocasionará um bafafá desnecessário para a academia. Timothée Chalamet e Colman Domingo estão em suas segundas indicações respectivas. Acredito que se Joaquin Phoenix não ganhou por sua perfomance em Johnny e June (2005, James Mangold), pouco provável que Timothée ganhe como Bob Dylan; já Domingo, sua performance aparenta remeter ao típico professor inspirador de outras produções como Sociedade dos Poetas Mortos (1990, Peter Weir), porém, este tipo não costuma render Oscars.

    Adrien Brody apresenta ser seu maior concorrente, já tendo vencido um Oscar, ele sempre consegue surpreender em cada uma de suas perfomances, porém, a performance de Fiennes aparenta ser mais contida, algo que o Oscar possa levar em consideração na hora do prêmio.

    MELHOR ATRIZ COADJUVANTE

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    Isabella Rosselini como Irmã Agnes em Conclave- Foto de Divulgação

    Indicadas:

    • Ariana Grande por Wicked
    • Felicity Jones por O Brutalista
    • Isabella Rosselini por Conclave
    • Monica Barbaro por Um Completo Desconhecido
    • Zoe Saldaña por Emilia Perez

    Isabelle Rosselini é uma atriz da vanguarda que recebe agora sua primeira nomeação, dentro de um papel extremamente pequeno, mas, marcando de maneira que poucas personagens conseguem com tão pouco tempo de tela.Sua maior competição será Zoe Saldaña com Emilia Perez, já tendo vencido o Globo de Ouro pela perfomance, Zoe vêm em peso para o Oscar.

    As demais candidatas se destacam em determinados meios, porém, acredito que o fato de esta ser a primeira, e talvez última indicação de Rosselini, o Oscar parabenize sua carreira por meio disto. Além do mais depois da morte recente de David Lynch, homenagear a atriz do grandioso Veludo Azul (1986, David Lynch), aparenta ser o mais certo e significativo.

    MELHOR ROTEIRO ADAPTADO

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    Ralph Fiennes como Cardeal Lawrence em Conclave- Foto de Divulgação

    Indicados:

    • Clint Bentley, Greg Kwedar, Clarence Maclin e John “Divine G” WhitField por Sing Sing
    • James Mangold e Jay Cocks por Um Completo Desconhecido
    • Jaques Audiard, Thomas Bidegain, Léa Mysius e Nicolas Livecchi por Emilia Perez
    • Peter Straughan por Conclave
    • Ramell Ross e Joslyn Barnes por Nickle Boys

    Já tendo ganho melhor roteiro no Globo de Ouro, Conclave apresenta grandes chances de repetir o feito, segundo Eduardo Lavinas, o roteiro de Conclave: “respeita a obra original, tratando o Conclave como um microcosmo da Igreja, onde fé e razão colidem em um ambiente fechado. Assim como na direção, evita-se qualquer interação externa, enfatizando o isolamento e a gravidade das decisões tomadas dentro da Capela Sistina.”

    A tensão constante a temática atual, ao mesmo tempo que remete a uma espécie de consulado romano, na medida que seus personagens são homens velhos e, em sua maioria, ambiciosos, permite um deleite para qualquer amante da sétima arte que gosta de intrigas palacianas.

    O final de Conclave transcende o filme à novos patamares, permitindo reflexões sobre fé e o papel do homem na sociedade, algo que a academia não deve deixar passar batido.

    MELHOR FILME

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    Pôster Oficial de Conclave

    Indicados:

    • Brian Young e Brady Corbet por O Brutalista
    • Coralie Fargeat por A Substância
    • Dennis Villeneuve, Mary Parent, Cale Boyter e Patrick McCormick por Duna: Parte 2
    • Edward Berger, Robert Harris e Juliette Howell por Conclave
    • James Mangold e Timothée Chalamamet por Um Completo Desconhecido
    • Jon M. Chu por Wicked
    • Joslyn Barnes, Dede Gardner e Jeremy Kleiner por Nickle Boys
    • Pascal Caucheteux e Jacques Audiard por Emilia Perez
    • Sean Baker, Alex Coco e Samantha Quan por Anora
    • Walter Salles e Rodrigo Teixeira por Ainda Estou Aqui

    A decisão de Melhor filme sempre é controversa, alguns filmes já ganharam em nome de uma mensagem, muitas vezes errônea, como foi o caso de Green Book: O Guia (2018, Peter Farrelly). Este ano, estão concorrendo em sua grande maioria filmes de drama, ficção científica e até mesmo terror com A Substância, algo raro nas cerimônias.

    Conclave apresenta uma vantagem que Spotlight: Segredos Revelados (2016, Tom McCarthy), vencedor do Oscar de Melhor filme em 2016, já provou ser verdade. A academia adora filmes de drama que discutem o real, aquilo que acontece e muitas vezes não é de consciência do grande público, assim, filmes bem feitos que mostram realidades não vistas, ou pouco conhecidas, atraem mais do que um filme de drama sobre duas bruxas em uma universidade, ou uma cinebiografia de um icônico cantor.

    Acredito que Conclave apresenta chances justamente por conta disso, além do fato de o Oscar tender à premiar dramas e thrillers em sua grande maioria, ao invés de ficção científica ou terror.

    DEMAIS CATEGORIAS

    Conclave também está indicado à melhor direção de arte, melhor figurino, melhor montagem e melhor trilha sonora. Nesta categorias, Conclave apresenta menor chances de ganhar. Direção de arte e figurino, acredito que Wicked levará com sobra, justamente por conta de seu universo fantástico. Trilha sonora, por mais que o baixo da trilha de Volker Bertelmann seja de arrepiar, pouco provável que seja suficiente ao se comparar com Kris Bower em Robô Selvagem.

    Montagem, porém, acredito que apresenta chances por conta da tensão constante que ela consegue trazer ao longo de toda a produção.

    CONCLUSÃO

    Conclave é um filme extremamente bem executado, que prende o espectador em um nível que poucos filmes conseguem, agradando qualquer um que entre no cinema, apesar de seu ritmo um pouco lento. Sua narrativa é atual e ao mesmo tempo épica, remetendo à organização de um senado romano em certas partes.

    Sendo indicado em 8 categorias, acredito que apresenta chances de levar no mínimo 4, incluindo dois dos principais prêmios da noite de 02 de Março: Melhor Roteiro e Melhor Filme.

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  • De Valente a Monstros S.A.: A Linha do Tempo da Teoria da Pixar Explicada

    De Valente a Monstros S.A.: A Linha do Tempo da Teoria da Pixar Explicada

    A Teoria da Pixar, uma fascinante especulação entre fãs e estudiosos do cinema, propõe que todos os filmes produzidos pela Pixar Animation Studios estão conectados e existem dentro de um mesmo universo. Essa teoria ganhou notoriedade principalmente através da internet, onde adeptos começaram a apontar e a discutir várias evidências e easter eggs espalhados pelos filmes, sugerindo uma cronologia unificada e uma narrativa interligada. O fascínio por essa teoria ressalta não apenas a habilidade da Pixar em tecer histórias envolventes e personagens memoráveis mas também seu talento para criar um mundo rico e detalhado que encanta espectadores de todas as idades.

    Origens e Desenvolvimento

    A Teoria da Pixar foi popularizada por Jon Negroni, que em 2013 publicou uma extensa análise detalhando como os filmes da Pixar poderiam estar conectados. Negroni propôs uma linha do tempo começando com “Valente” (ambientado na Idade Média) e terminando com “Monstros S.A.” (num futuro distante), onde portais para o tempo humano são usados para coletar energia das emoções das crianças. Segundo a teoria, a magia vista em “Valente”, que permite a manipulação da realidade e a concessão de inteligência a animais e objetos inanimados, é a base para os eventos que conectam todos os filmes.

    Evidências e Conexões

    As evidências que sustentam a Teoria da Pixar são principalmente easter eggs e pequenas referências colocadas nos filmes. Por exemplo, a aparição da van de entregas da Pizza Planet de “Toy Story” em vários outros filmes da Pixar, ou o número A113, que aparece em praticamente todos os filmes, uma referência à sala de aula de muitos animadores da Pixar no California Institute of the Arts. Além disso, personagens de um filme às vezes aparecem como brinquedos ou imagens em outros, sugerindo uma sobreposição ou conexão entre esses mundos.

    Implicações e Temas Comuns

    A teoria também destaca temas recorrentes nos filmes da Pixar, como a relação entre humanos e não-humanos (animais, robôs, brinquedos), a importância da família e da amizade, e a jornada em busca da própria identidade. Esses temas não apenas criam uma sensação de continuidade em todo o universo da Pixar mas também refletem preocupações universais, tornando os filmes acessíveis e relevantes para uma audiência ampla.

    Críticas e Resposta da Pixar

    Embora a Teoria da Pixar seja amplamente discutida e apreciada por fãs, ela também enfrenta críticas. Alguns argumentam que as conexões são apenas coincidências ou easter eggs divertidos, sem intenção de criar um universo compartilhado. A Pixar, por sua vez, tem uma postura ambígua em relação à teoria. Enquanto alguns membros da equipe expressaram entusiasmo e até incentivaram as especulações, oficialmente a empresa não confirmou nem negou a existência de um universo conectado.

    Conclusão

    Independentemente da intenção original da Pixar, a Teoria da Pixar é um testemunho do impacto cultural e da riqueza criativa dos filmes da empresa. Ela estimula discussões entre os fãs e convida a audiências a explorar mais profundamente o mundo dos filmes, buscando conexões e significados ocultos. Em última análise, a Teoria da Pixar celebra a magia da narrativa e a arte da animação, reforçando o lugar da Pixar como uma pioneira na criação de mundos cinematográficos envolventes e interconectados.

  • O Exorcista | 50 anos do pesadelo de Deus

    O Exorcista | 50 anos do pesadelo de Deus

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    Ellen Burstyn em O Exorcista, 1973, William Friedkin

    Tudo escuro. Chris MacNeil anda por sua casa. Madrugada. Entra no quarto de sua filha, Regan, para ver se está tudo bem. Sua janela está aberta enquanto a menina está descoberta. Fechar, cobrir e tranquilizar-se, a Chris — está tudo bem. Exceto por um barulho no sótão. São ratos? Não, não são ratos. Então, de onde vem esse barulho? Que barulho? Tabuleiro Ouija e Capitão Howdy. Regan não consegue dormir. Sua cama balança muito durante a noite. Mentira? Exames. Médicos. Remédios. Festa e xixi no tapete, a Regan. Constrangimento. Chris garante à filha que está tudo bem: “São só os nervos!”, garante Chris sob a certeza médica. Verdade? Até ela, a Chris, testemunhar a cama de sua filha mover-se e pular-se de si mesma de forma intrigante e inexplicável! Espasmos, problemas cerebrais e químicos: “Sra. MacNeil, o problema de sua filha não é a cama, mas sim seu cérebro!”, reitera o médico. Os nervos? Então os problemas de Regan são de ordem interna, não externa? Impossível! O que pode ser, então?

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    Linda Blair em O Exorcista, 1973, William Friedkin

    Em 1973, uma garotinha virou a cabeça de todo o mundo do cinema para sempre, tocando em nossos medos mais internos e fazendo-nos temer o escuro ao longo de muitos anos, tal qual crianças medrosas. Há 50 anos, William Friedkin levava às telonas o maior clássico do terror mundial, “O Exorcista”; inspirado pelo romance homônimo de William Peter Blatty, de 1971, baseado num caso real de possessão demoníaca dos anos 1940, registrado e confirmado pelo Vaticano. Mas afinal, o que é verdade e o que é mentira ao redor do filme, seus bastidores, repercussão e os fatos que o inspiraram? É verdade que o estúdio onde o filme foi gravado pegou fogo? Linda Blair está morta? Quantas pessoas da produção do filme morreram? Teve gente que passou mal durante a sessão do filme? Em dez ítens ou mais, vamos desvendar os cinquenta anos do maior pesadelo de Hollywood — O EXORCISTA.

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    Jack MacGowran em O Exorcista, 1973, William Friedkin

    I: PATER NOSTER, QUI ES IN CAELIS:

    Quantas pessoas da produção do filme morreram? Será que algum tipo de manifestação demoníaca passou a perseguir seus profissionais? Entre o “sim” e o “não”, prefiro o “só Deus sabe” — e o Diabo, também. O que você acha? Enfim, vamos ao falecidos:

    ✓ Jack MacGowran: o ator interpretou o diretor Burke Dennings, que morre de forma estranha dentro do enredo do filme. Na vida real, porém, pouco depois de terminar sua participação no projeto, foi vítima de uma gripe fortíssima que assolou Londres em 1973.

    ✓ Vasiliki Maliaros: a atriz interpretou a mãe do Padre Karras (Jason Miller), que sofre com a ausência e, de certo modo, negligência do filho no enredo do filme. Logo depois de sua participação, sem chances de ver o corte final do longa, Vasiliki faleceu de causas naturais, de acordo com laudo médico, em Nova York, em fevereiro de 1973.

    ✓ Outras tantas mortes suspeitas também ocorreram, como o falecimento do avô de Linda Blair, o irmão de Max von Sydow, um dos seguranças do estúdio de gravação, um dos profissionais em efeitos especiais, a esposa grávida de um dos profissionais da equipe perdeu o bebê. Enfim, urucubaca é o que não faltou nos bastidores deste filme!

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    Ronald Edwin Hunkeler, o garoto que inspirou o livro de Peter Blatty

    II: SANCTIFICETUR NOMEN TUUM:

    William Peter Blatty realmente baseou-se num caso real de possessão demoníaca? SIM. Vamos resumir a história: nos anos 1940, em Maryland, Estados Unidos, um garoto de 14 anos, Ronald Edwin Hunkeler, estava a apresentar estranhos comportamentos depois de tentar comunicar-se com o espírito de sua tia através de um Tabuleiro Ouija (sem contar com as diversas manifestações paranormais em sua casa, como barulhos misteriosos e cheiros horríveis de podridão e fezes). Os pais do garoto pediram ajuda à Igreja Católica, que de pronto recusou-se a realizar o ritual alegando que precisava de testes e provas de que manifestações paranormais estavam, de fato, a atormentar-lhe o cotidiano.

    Diante de tal situação, testes, exames e entrevistas psicológicas foram realizadas com Hunkeler que comunicou-se em latim, língua que não possuía nenhum conhecimento, comprovando a possessão, Apesar de Luterana, a família recorreu a padres experientes no ritual de exorcismo católico para cuidar de Hunkeler da melhor forma possível. Em um espaço de três meses, cerca de vinte exorcismos ocorreram. Depois de se livrar da entidade em 1949, Ronald Edwin Hunkeler ficou com medo das represálias que poderia sofrer graças aos rituais a que foi submetido na adolescência. Sua identidade foi protegida, e ele levou uma vida comum ao lado de sua esposa e filhos. O caso, à época dos rituais todos, foi reportado por alguns jornais, despertando a curiosidade de Peter Blatty e fazendo-o escrever seu romance best-seller “O Exorcista”.

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    Friedkin nos bastidores de O Exorcista, 1973

    III: ADVENIAT (VENIAT) REGNUM TUUM:

    O set de filmagens era assombrado? Um padre jesuíta foi chamado pela equipe de produção para abençoar o set de filmagens. Não por menos, pois coisas inexplicáveis passaram a ocorrer durante as gravações, como:

    ✓ Um fogaréu misterioso lambeu parte dos cenários, deixando apenas o quarto da Regan intacto, onde o exorcismo o ritual de exorcismo ocorre;

    ✓ Na construção, ou reconstrução, de alguns cenários, um operário cortou o dedão do pé com um serrote enquanto outro serrou o polegar. Então, sim, o set de filmagens era assombrado!

    Burstyn e Friedkin nos bastidores de O Exorcista, 1973, William Friedkin

    VI: FIAT VOLUNTAS TUA, SICUT IN CAELO ET IN TERRA:

    William Friedkin foi um diretor exigente? Sim, Friedkin foi um diretor bem exigente. Na verdade, exigente até demais! Ao longo da produção, ele maltratava o elenco, assustava-os, estapeava-os e, com um revólver, atirava pra cima — tudo para manter o clima denso e tenso que a história estava a exigir. Em um de seus episódios de loucura, Friedkin fez com que Ellen Burstyn (Chris MacNeil) sofresse danos permanentes em sua coluna em uma das várias cenas que sua personagem briga com Regan.

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    William Peter Blatty no Óscar 1974

    V: PANEM NOSTRUM COTTIDIANUM (SUPERSUBSTANTIALEM) DA NOBIS HODIE:

    Entre indicações e premiações, “O Exorcista” foi reconhecido quantas vezes?

    GLOBO DE OURO:

    O filme ganhou em quatro categorias: Melhor Filme – Drama, Melhor Diretor, Melhor Roteiro e Melhor Atriz Coadjuvante – Linda Blair;

    BAFTA:

    Indicado ao BAFTA na categoria Melhor Som;

    ACADEMY OF SCIENCE FICTION, FANTASY & HORROR FILMS:

    O filme ganhou em quatro categorias: Melhor Maquiagem, Melhor Filme de Terror, Melhores Efeitos Especiais e Melhor Roteiro;

    OSCAR 1974:

    O filme foi indicado nas categorias: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia, Melhor Direção de Arte, Melhor Edição e Melhor Som. Ganhando nas categorias: Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Som.

    Apesar do Óscar ter suas reservas com relação a filmes de gênero, “O Exorcista” foi o primeiro filme de terror a ser indicado na categoria Melhor Filme.

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    Filas para sessões de O Exorcista, Estados Unidos, 1973/1974

    VI: ET DIMITTE NOBIS DEBITA NOSTRA:

    É verdade que teve gente que passou mal durante as sessões de “O Exorcista”? Sim! Havia pessoas que desmaiavam, vomitavam, enlouqueciam de todas as formas antes, durante e após as sessões do filme. Para exemplificar, dois casos curiosos:

    ✓ Sacos de vômito tiveram que ser distribuídos antes das sessões do filme;

    ✓ Linda Blair passou a ser ameaçada por fanáticos religiosos, que acusavam-na de “glorificar o Demônio”, tendo que ser escoltada por uma equipe de seguranças contratada pelo estúdio por seis meses;

    Cenas gráficas somadas a um clima assustador e pesado motivaram tais reações. Por um lado, foi ótimo, tornando o filme de Friedkin o mais lucrativo da Warner de todos os tempos (levando em conta as correções monetárias, claramente), e também o início dos chamados blockbusters. Veja agora um vídeo que exprime bem o que foi o fenômeno “O Exorcista” em sua época de lançamento:

    https://youtu.be/AkIqFK3KoZ4
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    Chamada sobre O Exorcista em um jornal

    VII: SICUT ET NOS DIMITTIMUS DEBITORIBUS NOSTRIS:

    Ainda falando sobre a exibição do filme:

    ✓ Algumas cidades do Reino Unido proibiram sua exibição. O que fazer? A produtora local fretou um ônibus (The Exorcist Bus), para levar o público aos cinemas que estavam exibindo o filme;

    ✓ Aqui no Brasil foi quase a mesma situação do Reino Unido. Pessoas iam de uma cidade pra outra para assistir ao filme, mas não por motivos de proibições. É que algumas cidades ainda não tinham cinema, sendo necessário transportar público até cidades maiores, ou capitais, para que o longa pudesse ser assistido;

    ✓ A Warner teve que retirar o primeiro trailer do filme dos cinemas, pois estava sendo considerado muito assustador para plateias médias. Veja o vídeo abaixo e assuste-se também!

    Leia também: O Exorcista: Qual a Melhor Forma de Crer em Deus? Enfrentando o Diabo!

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    Mercedes McCambridge, a voz de Pazuzu

    IIX: ET NE NOS INDUCAS IN TEMPTATIONEM: 

    Sobre vozes e sons, duas curiosidades sobre um importante componente da narrativa de filmes de terror: 

    ✓ Mercedes McCambridge foi a responsável por dar voz ao demônio Pazuzu. Muito cigarro, whisky e ovo cru encarnaram perfeitamente uma voz ameaçadora num corpo desconfigurado por uma entidade externa de uma garota indefesa — mistura sincrônica de som e imagem, atingindo seu maior objetivo: o medo! 

    ✓ Porém, nem tudo são flores, pois Mercedes não foi creditada no filme, sendo aberto alguns processos contra o estúdio; 

    ✓ Ainda falando sobre sons, vozes e afins, a produção foi a um abatedouro próximo do set de filmagens, e gravou porcos em abate. Sob a batuta do mexicano Gonzalo Gavira, responsável pela mixagem de som do filme, os berros dos animais foram misturados nos sons dos momentos mais tensos do filme, potencializando a cena. Não à toa, o filme ganhou na categoria Oscar de Melhor Som.

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    Câmara fria. Bastidores de O Exorcista, 1973, William Friedkin

    IX: SED LIBERA NOS A MALO: 

    Mais algumas curiosidades: 

    ✓ Várias entidades religiosas, inclusive pastores, como Billy Graham, alegavam que o longa de Friedkin era possuído por algum espírito maligno. Campanhas foram organizadas até o Vaticano para proibir sua exibição. Deu em alguma coisa? Propaganda grátis ao filme! 

    ✓ O ator Max von Sydow tinha apenas 44 anos quando deu vida ao Padre Marrin; 

    ✓ Nas cenas do exorcismo em si, os padres e a menina encapetada estavam soltando fumacinha pela boca. Computação gráfica? Nada disso: o set estava sendo resfriado por potentes máquinas de ar-condicionado. Tanto é que alguns atores ficaram com pneumonia; 

    ✓ Sabe quando Padre Merrim chega à casa de Chris para iniciar o ritual de exorcismo? Ela é baseada na pintura “Império da Luz”, 1954, de René Magritte; 

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    Cena de O Exorcista inspirada na pintura de Magritte

    ✓ Sabe a cena do vômito? Então: aquilo na verdade é sopa enlatada de ervilha, que deveria ter sido jogada no peito de Jason Miller. Porém, a sopa acabou acertando seu rosto, irritando-o mas não saindo do personagem. Friedkin adorou a cena, tornando-a icônica; 

    ✓ Falando em cenas icônicas, a primeira versão do filme não tem a cena da Regan descendo as escadas. Por que? Porque a atriz que a realizou, foi auxiliada por cabos de segurança. Friedkin não conseguiu, à época, retirá-los do corte final do filme, sendo possível somente em 2000, em seu relançamento, na famosa “versão do diretor”; 

    ✓ E falando sobre a “versão do diretor”, sua duração com relação ao corte de 1973, tem aproximadamente 10 minutos a mais. 

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    Imagem da sequência de O Exorcista | O Exorcista, o Devoto, outubro, 2023

    X: AMEM:

    Quantas continuações “O Exorcista” teve? Conte comigo:

    Sequências no cinema:

    ✓ O Exorcista II – O Herege, 1977;

    ✓ O Exorcista III, 1990;

    ✓ O Exorcista – O Início, 2004;

    ✓ Domínio, 2005;

    ✓ O Exorcista – O Devoto, 2023.

    Sequência na televisão:

    ✓ The Exorcist, seriado de 2016 a 2017.